Precedente do STJ sobre prisão de depositário infiel

HC. DEPOSITÁRIO INFIEL. PRISÃO. A prisão civil do depositário judicial infiel não encontra guarida no ordenamento jurídico (art. 5º, LXVII, da CF/1988), em quaisquer de suas modalidades, quais sejam, a legal e a contratual. Ela configura constrangimento ilegal, máxime quando há manifestação da Corte Suprema em vedar a sua decretação. Após a ratificação pelo Brasil, sem qualquer reserva, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11) e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), art. 7º, § 7º, ambos do ano de 1992, não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel. Isso porque o caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos reserva-lhes lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação. Assim, ocorreu com o art. 1.287 do CC/1916 e com o DL n. 911/1969, tal como em relação ao art. 652 do CC/2002. A CF/1988, de índole pós-positivista e fundamento de todo o ordenamento jurídico, expressa como vontade popular que a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos estados, municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como um dos seus fundamentos a dignidade da pessoa humana como instrumento realizador de seu ideário de construção de uma sociedade justa e solidária. Por sua vez, o STF, realizando interpretação sistemática dos direitos humanos fundamentais, promoveu considerável mudança acerca do tema em foco, assegurando os valores supremos do texto magno. Ademais, o Pleno do STF retomou o julgamento do RE 466.343-SP, DJ 12/12/2008, concluindo, desse modo, pela inconstitucionalidade da prisão civil do depositário infiel. Diante disso, a Turma deu provimento ao recurso. RHC 19.406-MG, Rel. originário Min. José Delgado, Rel. para acórdão Min. Luiz Fux (RISTJ, art. 52, IV, b), julgado em 5/2/2009.

Função Social dos Contratos

Precedentes do STJ sobre o princípio da função social dos contratos:


“DIREITO CIVIL E AGRÁRIO. COMPRA E VENDA DE SAFRA FUTURA A PREÇO CERTO. ALTERAÇÃO DO VALOR DO PRODUTO NO MERCADO. CIRCUNSTÂNCIA PREVISÍVEL. ONEROSIDADE EXCESSIVA. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO, BOA-FÉ OBJETIVA E PROBIDADE. INEXISTÊNCIA.
– A compra e venda de safra futura, a preço certo, obriga as partes se o fato que alterou o valor do produto agrícola não era imprevisível.
– Na hipótese afigura-se impossível admitir onerosidade excessiva, inclusive porque a alta do dólar em virtude das eleições presidenciais e da iminência de guerra no Oriente Médio – motivos alegados pelo recorrido para sustentar a ocorrência de acontecimento extraordinário – porque são circunstâncias previsíveis, que podem ser levadas em consideração quando se contrata a venda para entrega futura com preço certo.
– O fato do comprador obter maior margem de lucro na revenda, decorrente da majoração do preço do produto no mercado após a celebração do negócio, não indica a existência de má-fé, improbidade ou tentativa de desvio da função social do contrato.
A função social infligida ao contrato não pode desconsiderar seu papel primário e natural, que é o econômico. Ao assegurar a venda de sua colheita futura, é de se esperar que o produtor inclua nos seus cálculos todos os custos em que poderá incorrer, tanto os decorrentes dos próprios termos do contrato, como aqueles derivados das condições da lavoura.
– A boa-fé objetiva se apresenta como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse modelo, agindo como agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal.
Não tendo o comprador agido de forma contrária a tais princípios, não há como inquinar seu comportamento de violador da boa-fé objetiva.
Recurso especial conhecido e provido.”
(REsp 803.481/GO, Rel. Ministra  NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/06/2007, DJ 01/08/2007 p. 462)

“RECURSO ESPECIAL.. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. IMPUGNAÇÃO EXCLUSIVAMENTE AOS DISPOSITIVOS DE DIREITO MATERIAL. POSSIBILIDADE. FRACIONAMENTO DE HIPOTECA. ART. 1488 DO CC/02. APLICABILIDADE AOS CONTRATOS EM CURSO. INTELIGÊNCIA DO ART. 2035 DO CC/02. APLICAÇÃO DO PRINCIPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS.
– Se não há ofensa direta à legislação processual na decisão do Tribunal que revoga tutela antecipadamente concedida pelo Juízo de Primeiro Grau, é possível a interposição de Recurso Especial mencionando exclusivamente a violação dos dispositivos de direito material que deram fundamento à decisão..
O art. 1488 do CC/02, que regula a possibilidade de fracionamento de hipoteca, consubstancia uma das hipóteses de materialização do princípio da função social dos contratos, aplicando-se, portanto, imediatamente às relações jurídicas em curso, nos termos do art.
2035 do CC/02.
– Não cabe aplicar a multa do art. 538, § único, do CPC, nas hipóteses em que há omissão no acórdão recorrido, ainda que tal omissão não implique a nulidade do aresto.
– Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.”
(REsp  691.738/SC, Rel. Ministra  NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/05/2005, DJ 26/09/2005 p. 372)

Boa-Fé Objetiva

Princípio da Boa-Fé objetiva, em sua função de controle.

Precedente do STJ:

“DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. SEGURO SAÚDE. CONTRATAÇÃO ANTERIOR À VIGÊNCIA DO CDC E À LEI 9.656/98. EXISTÊNCIA DE TRATO SUCESSIVO.
INCIDÊNCIA DO CDC, MAS NÃO DA LEI 9.656/98. BOA-FÉ OBJETIVA. PRÓTESE NECESSÁRIA À CIRURGIA DE ANGIOPLASTIA. ILEGALIDADE DA EXCLUSÃO DE “STENTS” DA COBERTURA SECURITÁRIA. DANO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE REPARAR OS DANOS MATERIAIS.
– As disposições da Lei 9.656/98 só se aplicam aos contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como para os contratos que, celebrados anteriormente, foram adaptados para seu regime. A Lei 9.656/98 não retroage, entretanto, para atingir o contrato celebrado por segurados que, no exercício de sua liberdade de escolha, mantiveram seus planos antigos sem qualquer adaptação.
– Embora o CDC não retroaja para alcançar efeitos presentes e futuros de contratos celebrados anteriormente a sua vigência, a legislação consumerista regula os efeitos presentes de contratos de trato sucessivo e que, por isso, foram renovados já no período de sua vigência.
– Dada a natureza de trato sucessivo do contrato de seguro saúde, o CDC rege as renovações que se deram sob sua vigência, não havendo que se falar aí em retroação da lei nova.
A cláusula geral de boa-fé objetiva, implícita em nosso ordenamento antes da vigência do CDC e do CC/2002, mas explicitada a partir desses marcos legislativos, impõe deveres de conduta leal aos contratantes e funciona como um limite ao exercício abusivo de direitos.
O direito subjetivo assegurado em contrato não pode ser exercido de forma a subtrair do negócio sua finalidade precípua. Assim, se determinado procedimento cirúrgico está incluído na cobertura securitária, não é legítimo exigir que o segurado se submeta a ele, mas não instale as próteses necessárias para a plena recuperação de sua saúde.
– É abusiva a cláusula contratual que exclui de cobertura a colocação de “stent”, quando este é necessário ao bom êxito do procedimento cirúrgico coberto pelo plano de saúde. Precedentes.
– Conquanto geralmente nos contratos o mero inadimplemento não seja causa para ocorrência de danos morais, a jurisprudência desta Corte vem reconhecendo o direito ao ressarcimento dos danos morais advindos da injusta recusa de cobertura de seguro saúde, pois tal fato agrava a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do segurado, uma vez que, ao pedir a autorização da seguradora, já se encontra em condição de dor, de abalo psicológico e com a saúde debilitada.
Recurso especial a que se dá parcial provimento.”
(REsp 735.168/RJ, Rel. Ministra  NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/03/2008, DJe 26/03/2008)

Princípio da boa-fé objetiva, em sua função de controle (supressio e surrectio)

Precedente do STJ:

“Processual Civil. Civil. Recurso Especial. Prequestionamento.
Condomínio. Área comum. Utilização. Exclusividade. Circunstâncias concretas. Uso prolongado. Autorização dos condôminos. Condições físicas de acesso. Expectativa dos proprietários. Princípio da boa-fé objetiva.
– O Recurso Especial carece de prequestionamento quando a questão federal suscitada não foi debatida no acórdão recorrido.
– Diante das circunstâncias concretas dos autos, nos quais os proprietários de duas unidades condominiais fazem uso exclusivo de área de propriedade comum, que há mais de 30 anos só eram utilizadas pelos moradores das referidas unidades, pois eram os únicos com acesso ao local, e estavam autorizados por Assembléia condominial, tal situação deve ser mantida, por aplicação do princípio da boa-fé objetiva.
(REsp 356.821/RJ, Rel. Ministra  NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/04/2002, DJ 05/08/2002 p. 334)”